sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Na escuridão do tempo!

Machuca os dias vividos entre silêncio e escuridão,
Diante do triste apagão de uma mente viageira...
Saudade de outros tempos, de outros sorrisos fartos,
Que ficaram nos retratos, escusos na imaginação.

Hoje uma menina brinca com trapos envelhecidos,
Por certo já esquecidos de quem fora, na verdade,
E os olhos da tristeza de quem com jeito acarinha,
Se alimenta do que tinha nos retratos da saudade!

O tempo passa às pressas nublando a terna paisagem,
E confunde a imagem de dois olhos entristecidos...
Da Mãe se tornou a filha, sem entender o que passa,
E a vida quebrou a taça, deixando cacos perdidos!

Ficaram velhos sorriso nos retratos da saudade...
E os olhos de Santidade, no silêncio das orações,
A Mão segurando trêmula sem força para o abraço,
E corações em pedaços juntando os cacos do chão.

Os olhos embaçados já não conhecem os seus...
E a lembrança se perdeu por entre nuvens escuras,
Tudo foi esquecido diante do tempo de esperas...
E até mesmo de quem era, se distanciou na lonjura.

Há retalhos enxovalhados de um tempo tão distante,
Quem modifica o semblante sem identificar a figura,
E seres de outros mundos rondando portas e janelas,
E algum outro de sentinela em forma de criatura.

Mas só ela reconhece, com seu olhar esquecido,
Talvez tenham vividos, algo que se desconhece...
E resmungando palavras que só a ela tem sentido,
Encontra o mundo perdido diante de nossas preces.

Não sei se são filhos ou Pais. Avós. Quem sabe irmãos,
Que por alguma razão estão sempre a cuidá-la...
E o seu olhar se perde no vazio que mente vaga...
E que levaram as palavras, pelo esquecido da fala!

Há um embrulhado de fios na escuridão da mente,
E o corpo se ressente sem a firmeza dos passos...
A noite traz os fantasmas que chegam no entardecer,
E a mente tenta reviver o que perdeu no espaço,

Apagaram-se as luzes na escuridão da memória,
E a lua que tinha a glória de ser luz na escuridão,
Ofuscou o seu sorriso para o brilho de cada flor...
Mas ensinou que o amor vale tanto quanto o perdão.

Para sempre serás cuidada, até o dia de perdê-la,
E voltarás à ser estrela num céu radiante de luz...
Até o dia de encontrá-la, pra ver de novo o seu brilho,
E novamente ser teu filho, aliviando a minha cruz!

Mariazinha Papeleira!

 Mariazinha Papeleira,
Era tão miudinha...
Que chamavam Mariazinha,
Mas o certo seria, Maria guerreira!

Eu conheci a Mariazinha...
Numa noite clara de lua,
Andando ali pelas ruas...
As catas de Papelão,
Levando um filho pela Mão,
Como quem leva uma criança,
Sem se importar co’a distância,
Que existe na solidão!

Não tinha um rumo certo,
Sem um local pra pousada,
Não tinha casa para morada,
Eram andantes, andarilhos...
Nos olhos tristes, sem brilho,
Uma esperança incontida...
De quem largou tudo na vida...
Para viver junto do filho!

Maria Helena de Bragança,
Pereira, Azevedo e Corte Real,
Já fora esposa de General...
Já fora filha da nobreza...
Já desfilara na certeza...
De bailes, festas, saraus,
E nos clubes da Capital...
Vivera entre a riqueza.

Empregados nem contava,
Dama de honra, companhia,
As Madames da Lombardia,
Os encontros, os olhares,
Museus, viagens, solares...
Perdeu a conta de tantos...
Luzindo vestidos brancos...
Como as deusas nos altares!

Taças folhadas a ouro...
Talheres da mais pura fineza,
Toalhas bordadas nas mesas,
Com os brasões de Alfarràs...
Vivendo seu mundo de paz,
Quais esses contos de fada,
Que parecem serem cuidadas,
Pra não padecer nunca mais.

Mas a vida tem um preço...
Às vezes se paga co’a sorte,
Sentiu de perto a morte...
Ficou órfã muito cedo...
Carregando olhos de medo,
Parece ter chegado sua vez,
Sentindo o peso da viuvez...
Na trama do próprio enredo.

Ficou com filho nos braços,
E o seu encanto de rainha,
Entre os caminhos que tinha,
Eram tantos no apogeu...
Mas o menino cresceu...
Diante as mazelas que cobra,
E se viu diante das drogas...
E com as drogas, se perdeu!

Foram anos de eterna luta,
De pedidos, de internações,
De sofrenaços e de tirões...
Diante a tamanha desgraça,
Uma cortina de fumaça...
Para os olhos da sociedade,
O moço se foi sem piedade,
Por outras ruas e praças.

Na mãe veio o desespero,
Que adianta tanta fortuna,
Se a vida, por vez, arruma,
O mal que se perpetua...
Pois o bem, às vezes, atua,
Pelas lembranças que tinha...
Largou seu posto de rainha,
Para também viver nas ruas.

É por isso que, hoje, Maria,
Mendiga um tempo de novo...
Para as chacotas do povo,
Vem contemplar suas preces,
E por certo que ela merece,
Apesar do olhar sem brilho,
Não importa como esteja o filho,
Uma Mãe jamais esquece.

Mariazinha Papeleira,
Era tão miudinha...
Que chamavam Mariazinha,
Mas o certo seria, Maria guerreira!

Quando me paro no espelho!

Há uma imagem refletida…
Caseando minhas retinas,
Reflexos que descortina,
E permanece ao meu lado,
Meu Pai, um cerne cravado,
Um palanque, uma tronqueira,
Um esteio para vida inteira…
Um Pau-ferro, enraizado.

Sustentou na cana do braço,
Os manotaços do tempo…
A força bruta dos ventos…
Em seus hediondos temporais,
Sofrenou a força de baguais,
Desses dias mal costeados,
Que se param embodocados,
No ermo dos pafonais.

Meu Pai tinha capa de herói…
Num Fiateci de estampa,
Que atirava sobre a anca,
De um zaino, frente aberta,
Que andava de orelha alerta,
E mal pisava o pasto...
Sentindo o ranger do basto,
E cada tento que aperta!

Nas manhãs enferruscadas,
Era o senhor das encilhas,
Bem do alto da coxilha...
Quando a geada branqueava,
Um maragato tremulava…
Como bandeira de guerra,
Mostrando o valor da terra,
E as razões que se peleava.

Meu Pai foi o cimento…
Foi a argamassa, foi o ferro,
Desde o meu primeiro berro,
Até as lições incompreendidas,
Foi o meu exemplo de vida…
As verdades, os conselhos,
Que ainda vejo no espelho,
Nessa imagem distorcida.

O tempo verga em silêncio,
A terra que não se planta…
E prende a voz na garganta,
Porque conhece seu valor…
Um pontaço no sangrador,
Desta lâmina da saudade,
Deixa um peito por metade,
Sangrando na própria dor.

Dor recheada de lembranças,
Dor carcomida de saudade…
Dor de sonhos e de verdades,
De contos, causos, gargalhadas,
Como eram lindas as madrugadas,
Um fogo grande, um galpão…
E um corcóvio de redomão…
No escaramuçar da potrada.

E aquela estampa domingueira,
Que ainda tento copiá-la…
De chegar abanando o pala,
Chapéu tapeado na nuca…
Esnobando a China Maruca,
Que um dia me meteu banca…
E já saltou das tamancas…
Ali na venda do Juca.

Porque a saudade é assim…
Faz lembrar do que foi bom?
Pois ainda escuto o som…
Da sua voz em meus ouvidos,
Me deixando dividido…
Entre o sonho e a realidade,
Um menino em tenra idade,
Que ainda chora escondido.

Hoje eu sigo essa estrada,
Que o senhor deixou aberta,
Sofrendo a cada descoberta,
Que não aprendi a tempo…
Guardando o sopro do vento,
A luz da lua, o brilho do sol,
E esperando o arrebol…
Para buscá-lo em pensamento.

Talvez pra muitos é utopia…
Devaneios duma mente insana,
Guardar quem a gente ama…
A sua voz, os seus conselhos…
Até os estalos dos relhos…
Talvez seja só um desejo,
Mas é a sua imagem que vejo,
Quando me paro no espelho.

Uma parte de mim!

A paz que germina frutos,
No silencio dos casebres,
Se quebrou o uivo dos lobos,
Sedentos da mesma febre...
Vestido em pele de cordeiro,
Comendo na mesma mesa,
Espalham a dor que resiste,
Para os olhos da incerteza...

A Mão da simplicidade...
Abraça há tantos por igual,
Por viver com o bem por perto,
Já desconhecia do mal...
A Mão da simplicidade...
Que tinha sonhos e encantos,
E acariciava ternas notas,
Para enriquecer o seu canto!

Talvez o tempo não saiba,
Talvez a vida lhe guarde,
Mas as relíquias herdadas,
Tem marcas de saudades,
Marcas de outros tempos,
Que o tempo mudou de cor,
O papel timbrado das notas,
Não pagam o seu valor!

Essa gaitinha que pra muitos,
É apenas mais um objeto...
Foi relíquia dos meus avós,
E sonhava deixar pra os netos,
Foi parceira de tantas noites,
Embora não seja um tocador...
Me espantavam as tristezas,
Na hora amarga do desamor!

Quantas vezes no galpão,
Despois que todos partiam,
Acariciava minhas angústias,
Na única valsa que eu sabia?
Mal tocada, talvez, por certo...
Para quem conhece de cantiga,
Mas era perfeita para mim...
Que tinha a gaita como amiga!

Um dia chegou no rancho,
Não sei vindo de onde...
Alguém que a vida por si só,
Olha de longe e se esconde,
Mas abri a porta da casa...
Dei abrigo, como sempre faço,
Matei a fome e a sede...
Dei um cobertor de abraços.

Aqui no rancho é assim,
A gente pouco se importa,
Todos chegam e se abancam,
Não há tramelas nas portas...
As janelas sempre abertas...
Mesa farta e cama quente,
Mas, às vezes, o mal se faz,
E leva uma parte da gente!

E a gente por ser do bem...
Por viver rodeado de amigos,
Não vê o sorriso da maldade,
Nas artimanhas do perigo,
E a minha gaita parceira,
Tinha timbrado o meu nome,
Foi levada sorrateiramente...
Por quem eu matei a fome!

Não sei em que dia foi...
Ninguém sabe, ninguém viu,
Não tem uma testemunha,
Só sei que a gaita, sumiu...
Ficou uma dor angustiante,
Um par de olhos perdidos,
Uma incerteza inconstante,
De ajudar um desconhecido!

Fui dar parte ao delegado...
Procurei o Juiz, Promotor,
Andei por muitos costados,
Sem encontrar o comprador,
E descobri que outras tantas,
De casas simples, qual a minha,
Foram levadas do mesmo jeito,
Sem lhe dizer por que tinha!

Às vezes, eu fico pensando...
Como pode existir a maldade?
Quem compra essas relíquias,
Sem conhecer a identidade?...
Talvez seja pior que o ladrão,
Pois esse já se sabe o fim...
Levaram mais que uma gaita,
Levaram uma parte de mim!

Maria pequena!

Maria tinha seus receios...
Essas incertezas da vida,
São coisas de preconceito,
Que sangram velhas feridas,
Pois não era só a estatura...
Não era ausência de beleza,
Mas a angustia que se carrega,
Quando há olhar de incerteza!

Desde criança foi assim...
Quando chorava escondida,
E encobria os espelhos...
Com imagens destorcidas,
Não queria mais se ver...
Diante a luz da ilusão...
Esquecendo que ao amor,
Não há tamanho o coração.

E Maria ficou mocinha...
Ofuscada em seus lamentos,
Sem responder as perguntas,
Chibatadas do pensamento,
Que lhe feriam a alma...
Que incomodava a pena,
Quando olhares maldosos...
Lhe condenavam à pequena!

Alguém entende essa dor...
Do punhal do preconceito?
Quando a alma ferida...
Abre um buraco no peito?
Alguém tem ideia o que sente,
Aquele que sofre calado?
Por ter nascido diferente,
Precisa ser condenado?

Porque tanto julgamento,
Se somos todos iguais?
Porque uns sofrem tanto,
E outro sofrem ainda mais?
Porque te julgas melhor...
O que tu tens de diferente?
e Deus é igual pra todos,
E vive aqui dentro da gente?

Maria pequena sofria...
- Por se achar inferior –
Às vezes, até se escondia,
Para descarregar sua dor,
Mas o tempo foi passando,
E o tempo cobra seu preço,
E Maria foi conquistando...
O que lhe faltara no começo.

Lutou como lutam todas,
Para ser mais que existência,
Não se importava com olhares,
Vivia a própria consciência...
E embora o mundo insano,
Dos que só olham defeitos,
Maria se encontrou na poesia,
Ganhou do mundo respeito.

Se fez senhora dos livros,
Encheu de luz outras vidas,
Colocou Poesia no nome,
E estancou outras feridas...
Das pessoas, iguais a ela...
Que pelo tempo sofria,
Maria se fez exemplo...
Como a Luz de outra Maria!

Maria da Luz Poesia...
Pseudônimo de grandeza,
Pois certo não é o tamanho,
Que põe o Pão na mesa...
O tempo que nos iguala,
Em tão sublime sabedoria,
Que fez da tinta no papel...
Nascer uma nova Maria.

Aqueles que discriminam,
Continuam a falsa ilusão...
Alimentando preconceitos,
No mundo da escuridão...
Sem entender que a vida...
Não está no brilho dourado,
O mundo guarda caminhos,
Pra quem nasceu iluminado.

E Maria já nasceu grande,
Não para olhos tão rasos,
Pois as mais belas flores,
Nunca precisam de vasos,
É a vida ensinando formas,
Que cada um traz escrito...
Não justifique a ignorância,
Só entre o feio e o bonito.

E a Poesia abre caminhos,
Na vida de outras tantas,
Quando a tinta se esparrama,
Colhe-se o bem que se planta,
Germina os frutos do amor...
Escondidos entre os versos,
Enxuga as lágrimas da dor,
E espalha luz ao universo.

Maria, hoje, é o canto...
É verso – é sonho – é poesia,
Quem nunca teve tamanho,
Pelo tamanho lhe media...
Matando o olhar da criança,
Enchendo a moça de defeito,
Mas a mulher se fez grande,
Para pisar no preconceito.

Ao Mestre Chiquinho!

Nesta faculdade campeira,
Foi mestre na arte do verso,
Fez do campo, teu universo,
Tropeiro da Xucra rima...
Com o céu caindo por cima,
E a poesia dentro do sangue,
Reescreveu este Rio Grande,
Na mais bela obra prima!
Quando retiravas da alma...
O que só a tua alma sentia,
Nos emanava de poesia...
A quem seguia teus passos,
Sentindo a força do braço,
Como tranças de couro cru,
É porque poetas como tu...
Nesse mundo são escassos,
Um poeta jamais morre,
Na mente dos seguidores...
Quais à mim, admiradores,
Que da poesia, se deleita,
Verso bom, rima perfeita...
Iluminando os pergaminhos,
Que só tu, Mestre Chiquinho,
Poderia fazer tão bem-feita!
Por isso que a tua ausência,
Calou o peito de tantos...
Olhos marejados de pranto,
Bocas sedentas de poesia...
Ainda choram na lápide fria,
Onde o teu corpo descansa...
Sabendo que ficou de herança,
O teu versejar como guia!
Teus versos vivem nos livros,
No aconchego das memórias,
E ainda escreverá a história,
Do Francisco Sales Poeta...
Pois a tua vivência completa,
Desde o menino ao mestre,
São como as flores agrestes,
Com suas cores prediletas.
E tudo que aqui deixastes,
Pelas ruas de São Francisco,
Por certo ainda me arrisco,
A dizer com a mesma gana,
O teu verso nunca me engana,
A tua história está contada,
Nas duas terras sagradas...
São Chico e Manoel Viana.
Sei que chegaste no céu...
Como quem chega num upa,
Levando na mala de garupa,
Teus alfarrábios escritos...
Talvez os versos mais bonitos,
Que São Pedro tenha ouvido,
Quem sabe sejam divididos,
Com outros Santos, benditos!
Quem sabe o São Francisco,
O que foi o teu Padroeiro...
Hoje, te sejas, companheiro,
Para algum verso terrunho,
Nos dando o testemunho...
Quem era o mentor sagrado,
Que viveu, aqui, ao teu lado,
Escrevendo do próprio punho.
Quem sabe nas noites calmas,
Que a lua enfeitar os campos,
Tu possas chegar ao tranco...
Repontando rimas calmas...
Para o aconchego das almas,
Que ainda choram o teu luto...
Ou que pelo vento eu escuto,
Mil anjos batendo palmas!
E daqui eu possa aplaudi-lo...
Com reverencia do Mestre...
Por tudo que aqui fizestes,
Tanto orgulho que me deu...
De olhar nos olhos dos meus,
Sabendo que habita a poesia,
Aquela que declamaste um dia,
Hoje, tu recitas para Deus!
VERSO QUE ESCREVI EM 07.08.2015 NA PARTIDA DESSE MESTRE E QUE HAVIA POSTADO NO MEU BLOG ENTRE MATES E GUITARRA.
AGORA DEIXO PARA OS SENHORES.

Ensinamentos!


Foi meu Pai que me ensinou
quase tudo o que eu aprendi!
(e muitas coisas que não aprendi);
Fui piá, igual a tantos outros...
que seguiam os rastros dos seus Pais,
e levavam de tirão as lições do campo.
O meu primeiro caderno...
foi o chão batido de um galpão,
onde a ponta da adaga fazia as contas,
pelos socados das botas...
e uma tarca de osso, encordoava
os números na matemática terrunha,
sem erros, sem pressa...e sem tempo!
A física vinha da arte de fazer arte,
onde altura, comprimento e peso,
nada importava para artimanhas de piá;
Aprendi o português do campo...
Se, certo ou errado, pouco importa,
pois o que é légua de beiço pra quem
tem patas de bons cavalos?
Quase tudo o que aprendi...
foi meu Pai que me ensinou!
Aprendei a dor da vida quando
um laço arrebenta e que o vergão,
é apenas a marca que o tempo traz,
para sabermos que não somos...
tão fortes quanto à gente imagina;
E as vergas de um tombo...
quando um pingo roda,
a ciência jamais explica!
Aprendi que força e tempo não se conjugam,
mas se respeitam, pois um é ânimo...
e o outro é dono de todas as verdades!
Na química da erva, senti o gosto dos mates,
que fomentavam sonhos nas madrugadas,
enquanto a escola do mundo adormecia,
pelo negrume das horas de silêncio e de vazio.
A minha religião foi o campo!
Onde corujas agourentas, acendiam
os seus olhos grandes pelos castiçais das tramas...
e revoadas de vaga-lumes faziam suas
procissões de fé nas noites de verão.
Quase tudo o que aprendi...
foi meu Pai que me ensinou!
À distância, o tempo e a força,
de cortar o rastro de um boi...
e soltar as dose braças, tilintando ao vento,
só para ouvir o tinir da argola,
fazendo chalaça na outra ponta do laço.
Ah! Escola do campo...
hoje, já não ensinas mais ninguém!
O Pai foi embora retrucar as estrelas,
e a vida ganhou outro rumo...
O tempo já não dá tempo para
que outros campeiros aprendam:
- Que o respeito é uma verdade...
- Que os sonhos são caminhos...
- Que os valores são exatos...
- Que aprender é um direito,
não importa quem o ensina,
se um mestre ou o campo!
O que importa é que em tudo
há ensinamentos, basta querer!
Basta olhar e basta saber...
Pois quase tudo o que eu sei...
Foi o meu Pai que me ensinou!

quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Eu vi um dia...



Eu vi um dia... Antes da cancela do tempo se fechar pra mim...
O passo lento dos bois seguir tranqueando no corredor vazio,
Buscando o rumo até findar-se nas barrancas d’algum rio...
Onde homens sesteavam as sombras mansas dos confins;
Mas o progresso, que foi muito mais rápido do que os bois...
Deixou-me na memória o rangido, que ao tempo se perdeu,
E a carreta virou relíquia nas paredes escuras dos museus,
Entre tentos de ajoujos, rejeiras, cangas e um sonho que se foi.

Eu vi um dia... Por entre as ressolanas de um sol de abril...
A tropa mugindo triste culatreadas por campeiros de verdade,
Cruzar o horizonte que se findou na minha ingenuidade,
E na sombra de uma lua grande pelas noites se sumiu;
Deixando somente a poeira rasa de uma saudade louca,
Que sufoca a minha alma pelo calor das madrugadas...
Quando mateio, com a mesma alma, hoje, empoeirada,
Na amargura terrunha que ofusca o céu da minha boca.

Eu vi um dia... O homem na força bruta domar um cavalo,
E na maestria dos deuses que fazem a vida nas encilhas,
Cortar horizontes e canhadas no reponte de uma tropilha...
Acordando o Rio Grande bem antes do cantar dos galos;
E vestindo-se com o poncho rubro de um final de tarde...
Voltar ao rancho repontando anseios duma nova aurora,
Calçando a Pátria Sulina no gaguejar de cada espora...
Como se o tempo fosse mais rebelde do que a saudade.

Eu vi um dia... Ninguém me contou o que eu sei...
Que os homens antigos comungando na paz dos galpões,
Tinham o respeito, muito mais, do que as suas razões,
E o fio de bigode era documento maior do que a lei,
E uma palavra depois de empenhada, não tinha volta...
E o homem que não a cumprisse já sabia a sua pena,
Pois mais que a indiferença, a vergonha lhe condena,
Entre olhares rebenqueados na amargura das revoltas.

Eu vi um dia... Tanta coisa que, hoje, não vejo mais...
Não vejo, porque dizem que este mundo está mudado,
E a pressa galopeia como se não houvesse um passado,
Onde os filhos não respeitam nem importância dos Pais;
A janela que me oferecem nesse quarto de apartamento,
É um tubo de imagem que traz o mundo que não conheço,
Bem ali onde a ganância e a mentira são apenas adereços...
Rodeado por grades de ferro sobre os chãos, de cimento.

Eu vi um dia... E o que eu vi, hoje, me traz saudade...
Porque a vida é areia movediça que enterra aos poucos,
E o homem na sua elucides mais parece um louco...
Que destrói seu próprio mundo com gana de crueldade;
E não se contendo, ainda, com a destruição da terra...
Escraviza-se num progresso num barbaresco ritual,
Numa doença febril volta a ser um primitivo animal,
Extravasando seu ódio em potentes máquinas de guerra.

Eu vi um dia... E talvez, nunca mais, verei de novo...
Nas ilusões estradeiras que conduzem a minha alma,
Encontre quem sabe um dia, numa noite terna e calma,
A paz que um dia tive na simplicidade do meu povo;
E a vida, por ser bela, dê-me os momentos de alegria,
E o ranchinho ainda deitado lá num fundo de rincão...
Dê-me as noites mais ternas, no calor de algum galpão,
Para que possa envelhecer na ilusão dos meus dias.

E quando o vento do outono secar as folhas e os frutos,
Quem sabe encontre nas veredas dos meus confins...
A parte mais doce do que a vida guardou para mim,
E tire do próprio vento as canções que já não escuto;
Pois sei que envelheço e a idade não vem tardia...
Mas sei também que a morte é passagem derradeira,
Presente que nos foi dado para ter a vida inteira...
Mas roubaram-me ao tirarem tudo o que eu vi um dia.



Eu e as bonecas!





Não...eu não queria ter crescido!
Se eu pudesse voltar no tempo,
Para guardar todos os momentos,
E o brinquedos que eu mais queria,
Que por anos me deram alegrias,
De ser feliz com o que eu tinha...
Brincando em meu quarto, sozinha,
Fiz o meu mundo de fantasias.

Quando ganhei a primeira boneca,
Eu tinha uns três ou quatro anos...
Tão linda, minha boneca de pano,
Com seus cabelos encaracolados,
Olhos de botões, esverdeados...
Bochechas gordas e rosadas...
Ele era uma princesa, encantada,
Que dormia ali, do meu lado!

Depois vieram, outras e outras,
Umas grandes, outras pequenas,
Todas feitas de panos e rendas...
Das costuras que a Mamãe fazia,
Que no meu mundo de fantasias,
De menina encantada, inocente,
Elas eram uma parte da gente...
Que tinha o encanto e a magia.

No meu quarto criei castelos:
Iguais os que a Mamãe contava,
Onde até o criado mudo, falava,
Com suas “estórias” fantasiosas,
Para alguma boneca, chorosa...
Vir-se derramar em prantos,
Até eu ninar com o meu canto,
Aonde adormecia, a dengosa!

Eu tive muito trabalho...
Para cuidar de tantas bonecas,
Umas choronas, outras sapecas,
Umas sorrindo, outras cantando,
Às vezes elas ficavam escutando,
Guardando ali, nossos segredos,
Cumplices de sonhos e medos,
Meu tempo, assim, foi passando.

Hoje não tenho mais as bonecas,
Mas sinto muita falta delas...
O que a vida, hoje, me atrela,
No viver do meu dia a dia...
Me tirou toda essa magia,
Da inocência de uma criança,
Que viu o seu mundo na distância,
Com tudo o que eu mais queria.

Às vezes fico pensando:
- Por que as pessoas crescem?
Depois com o tempo, esquecem,
Do seu mundo, do seu passado,
Vivendo os sonhos guardados,
Pelas angústias e os medos,
Escondidas entre os segredos,
Que ainda vivem à seu lado!

Pois eu, jamais esqueço...
Daquela minha vida sapeca,
Meu mundo entre as bonecas,
E retalhos de colchas coloridas,
Que foi a minha história vivida,
Numa infância terna e doce...
Talvez esse tempo, até fosse...
Os anos mais felizes da minha vida!



Epígrafos de vida e tempo!

 

Coloquei reticências nas frases da vida,
Por saber que a vida não tem ponto final,
E refiz as metáforas de palavras seguidas,
Seguindo o caminho do meu próprio ideal.

Dei tempo ao tempo, sem tempo a seguir,
E fiz conjugação de algum verbo no singular,
Busquei no passado o meu futuro por vir...
E aprendi que o amor é o verbo a conjugar.

Coloquei reticências em frases e letras...
E me refiz na poesia, no abstrato dos versos,
A linguagem mais simples, estrofes perfeitas,
Adjetivando a palavra, na lavra do universo.

Mas a mão amojada de escritas e rimas...
Prefácios estranhos no ataúde do tempo,
Que fez da pena numa cena de esgrima,
Banhada na esfinge de áuricas e ventos.

Três pontos contínuos de um mesmo sinal,
Apontando um rumo que vai mais além...
Sem ponto de chegada sucessivo universal,
Que mostram o caminho, do fim que não tem.

Advérbios esquisitos, de sujeitos ocultos...
Adjuntos separados de número e numeral,
Predicados prediletos, imagens e vultos,
Fontes e fonemas de epigrafia anormal.

Escritas bonitas que na folha se enfeita,
Onde a pena rasteja sem pena do fim...
Para muito são versos, escritas perfeitas,
Para outros à pena, que tem pena de mim!

Escrevo o que sinto e sinto que devo...
Transpondo ao papel e para ele não minto,
Estranho conceito que logo me embebo,
Vedado ao segredo das coisas que sinto.

Nos dedos, as marcas já gastas do tempo,
No tempo, os sonhos que enfeitam o papel,
Epigrafia imperfeita de sons e sentimentos,
Na esperança que avança de um termo fiel.

Coloquei reticências nas frases da vida...
Caminho entreaberto, entre acento e sinal,
Deixei um espaço com parêntese em seguida,
Interrogação pretendida, no meu ponto final!

Fiz texto e pretexto com mesmo sentido...
Escravo das letras e das rimas perfeitas,
Balbuciei palavras ao pé do teu ouvido,
E não fui compreendido nas formas estreitas.

Epigrafei a minha vida em tempo real...
Num sujeito oculto que vagou pelos dias,
Adjetivando palavras bem longe do banal,
Descobri a metáfora que me fez poesia!





É teu, o meu coração!

 

Posso não ser letrado,
Tão pouco ser bonito,
E o que tenho escrito,
Não sejas do teu agrado,
Tudo que tenho guardado,
Não vale um só tostão…
E carrego entre as mãos,
Numa folha de papel…
Mas juro que sou fiel,
Pois é teu meu coração.

Talvez até à noite traga…
Em teus sonhos matutinos,
Meus tempos de menino,
O que a vida não apaga,
Enquanto o vento afaga,
Mesmo achando que não…
Nessas horas de solidão…
Enrolada em teus lençóis,
Sou eu pensando em nós,
Pois é teu meu coração.

Ouça o vento na janela…
E a chuva que bate forte,
Talvez seja a tua sorte…
Dançando ao lume da vela,
Aquela florzinha amarela…
Que encontrei no estradão,
Naquela tarde de verão…
Que eu te dei de presente,
Tenha um pouco da gente,
Pois é teu meu coração.

Este silêncio do campo,
Enquanto a noite embala,
Traz o som da tua fala,
No luzeiro dos pirilampos,
E até para ser franco,
É como se fosse canção…
Entre as paredes do galpão,
Aqui num fundo de posto,
Há duas cacimbas no rosto,
Pois é teu meu coração.

Meu mate anda amargo…
E as noites mais compridas,
Minha alma ressentida…
Brota nos sonhos que trago,
Vivendo longe do pago,
Nessas horas de precisão,
Que me pego em oração…
Pedindo à Virgem Maria…
Que chegue logo, outro dia,
Pois é teu meu coração.

Tenho um pingo no arreio,
E outro já no cabresto…
Falta encontrar pretexto,
Pra atorar o campo ao meio,
Sem falta e sem receio…
Quero encontrar razão…
Para apear no teu portão…
Antes que tarde finda…
Pra te buscar minha linda,
Pois é teu meu coração.

Entre a Pena e o Papel

Uma é fibra de folha delgada,
Por onde a pena rasteja... 
Que um dia a Mãe natureza,
Deu-lhe a vida, até a morte,
Quando uma árvore de porte,
Quedou ao soar do machado,
Deixando galhos tombados,
Na injusta lei do mais forte.

A outra é metal e tinta...
Deslizando sobre a folha,
Trazendo formas de bolha,
Em toda frase escrita...
Se, a letra não é bonita,
Na união de cada palavra,
O poeta é arador que lavra,
A Santa terra, bendita!

E quando as duas se juntam,
A mão daquele que escreve,
A pena fica mais leve,
Para o papel ganhar cor...
E a letra rebusca a dor,
Na singeleza do poema,
Afogando as duras penas,
De algum anjo escritor.

E assim nascem os versos,
E o papel ganha a vida,
A tinta fresca, escorrida...
Vai mudando a paisagem,
Estrofes formam imagens,
Para àquele atento que lê...
Até os olhos começam ver,
Como se fossem miragens.

E o papel ali exposto...
Ganha forma em moldura,
E a poesia transfigura...
O mais terrunho dilema,
Se a saudade não é pequena,
E as lembranças são tardias,
A noite veste-se da poesia...
Para aliviar as duras penas.

E o poema ganha o mundo,
Em outras folhas timbradas,
Todas unidas e decoradas...
Na estampa d’algum caderno,
São os momentos mais ternos,
De algum poeta, solitário...
Que faz do seu relicário,
Tornar-se um dia, eterno.

Depois, a pena se aquieta...
Mas o papel ganha vida,
E aquela dor escondida...
Que escorreram pelos dedos,
Foram saindo sem medo...
Na forma rude de um verso,
Até ganhar o Universo...
Estampando algum segredo.

E o poema é solto ao tempo,
Como quem clama em prece,
E até o vento emudece,
Vindo alumbrar meus dias,
Trazendo a noite vazia,
Para atormentar minha dor,
Pois quem não sofre de amor,
Não sabe o valor da poesia.

Não há instante mais terno,
Que um poeta meditando,
Talvez, são anjos falando,
No seu jeito menestrel...
E lá do palco do céu,
De alguma estrela sozinha,
Que ditando linha por linha,
Dão vida a pena e o papel.

E os sentimentos se afloram...
E os sentimentos se agigantam,
Até os mais rudes se encantam,
Com a beleza de um poema,
Quando mágoas e dilemas...
Essas dores do universo,
São trocadas por um verso,
Na magia de uma pena.

E assim o ciclo se encerra,
O papel, a pena e o poeta...
Formam a tríade predileta,
Das partes de um pentagrama,
Que o verso rude proclama,
Quando se junta à guitarra,
E ao mundo solta as amarras,
Dando vida a quem declama.

E a poesia já não é minha,
E a poesia já não é nossa...
Talvez um dia ela possa,
Trazer a paz que é clamor...
Se cada soldado, meu senhor!
Não tiver a alma, pequena,
Troca a arma por uma pena,
E faça versos de amor.

Duas Mulheres!


Duas mulheres...uma única dor!
A dor silenciosa que rompe a carne,
Que fere a alma, que mareja os olhos.
Cristais que se quebram...
Embebidas pelo vinho do amor,
E alimentam a esperança de outro amanhã.

Duas mulheres...uma mesma batalha!
Vidas vividas...sonhos iguais.
Incertezas incertas,
Luzeiros que reascendem ao bocejar das horas,
Sorrisos incontidos no sangue que esvai.

Carnes machucadas de agulhas febris,
Palavras e sorrisos...forças no olhar!
Mulheres guerreiras, numa batalha soturna,
Sombreando a angústia sem se desesperar.

E os dias que passam, passageiros de luz,
Apegadas as rezas na força do amor...
Embebidas no orvalho à noite que cega,
São forças latentes abraçadas na dor.

São duas mulheres... Anitas, Guerreiras...
Carregando ao calvário a sua própria cruz,
Sem nunca perguntarem o porquê da palavra,
...que o tempo ressalva pelos fachos da luz.

O tempo esperança de muito que espera,
A incerteza da cura que a carne requer...
E alma se agiganta dando vida à poesia,
Na força que irradia de uma outra mulher.

São duas mulheres...Maria ou Tereza!
Nos dando a certeza que nada é em vão,
De braços abertos na espera incontida...
Talvez, duas vidas, num só coração.

Benditas as Mulheres...
Que são Mães e amigas...
Benditas as filhas...
Que são luz e esperança!
Benditos os dias...
Que chegam silentes,
E não dão a certeza de um tempo presente,
Alimentando a confiança aos olhos da gente,
Que somos felizes...por duas mulheres!

Mulheres verdades...que a esperança embala,
Na maciez da fala, nas lágrimas da dor...
Abraçadas ao mundo na busca da cura,
Que a fé transfigura na forma do amor.

Guerreiras farrapas dos tempos modernos,
De sonhos maternos, de outras vidas, talvez,
Encantando a sorriso as imposições desta vida,
Com a carne ferida num abraço a três...

Benditas mulheres...benditos os ventres...
Que são vidas e sementes na luz que irradia,
Sentimentos profundos que o bem manifesta,
Quando a noite lhe empresta pra dar vida à poesia.

Cristais que não quebram ao aço da agulha,
Nem fazem carrancas no sonar dos talheres,
Por saber que o destino lhe escolheram à vida,
São exemplos ao mundo...essas duas mulheres.

Dos meus avós!


O tempo é lâmina de adaga,
Lonqueando os tentos da vida,
São as lembranças escondidas...
Que a memória guarda pra gente,
Quando o passado e o presente,
Se juntam no mesmo elo...
Daqueles momentos singelos,
Que eu jamais terei novamente.

São essas relíquias guardadas...
Que vivem dentro de nós,
Onde a lembrança dos avós,
Não são apenas imagens...
É como se fosses miragens,
Caseando o véu das retinas,
Quando se abrem as cortinas,
Trazendo belas paisagens.

Lembro-me da casa grande...
Sob o aconchego de um teto,
Meu avô rodeado de netos,
Abrindo os velos da memória,
Eram os momentos de glória,
Tão esperados, para gente...
Quando ouvíamos atentamente,
O "Nono" contando estórias.

E eram causos e causos...
Que pareciam não terem fim,
Alguns ainda guardo em mim,
Coisas que a gente não esquece,
Só parávamos na hora da prece,
Na oração da Ave Maria...
Quando a Vovó agradecia,
Por cada alimento que nos desse.

Bem ali na sala da frente,
No lusco fusco de um candeeiro,
Vinham os causos de carreteiro,
Pela solidão das estradas...
Ou alguma tropa espichada,
Rumando para o matadouro,
Que até causava algum choro,
E lágrimas na criançada.

Tinham causos de assombração,
De alguma alma penada,
Causos de domas e gineteadas...
Das peleias pelos bolichos...
Tinha os que dizia em cochicho,
De algum farrancho costeiro,
Onde, se metia de gaiteiro,
Só para arrumar cambicho.

De pronto, ouvia-se uma voz...
Chamando lá da cozinha,
E em cada palavra que vinha,
Tinha recheios de ternura...
Embora a vida fosse dura,
O amor da Vovó com a gente,
Era o mais belo presente...
Envolta de sonho e candura.

Pedia com voz serena:
Para não assustar as crianças,
Mas essa era a herança...
Que eu queria trazer comigo,
Ter meu Avô como amigo,
Ter a sua história, a sua vida...
Do que essa saudade ressentida,
Que hoje é mais que castigo.

Depois que a gente cresce...
È que se entende a saudade,
Fica um vazio, uma vontade,
Dando rédeas ao pensamento,
Tentando voltar no tempo...
Que se perdeu na distância,
E novamente ser uma criança.
Para viver aqueles momentos

Porque que a vida é assim?
Porque o tempo é fio de adaga?
Porque que a morte estraga...
E teima a nos deixar a sós?
Porque essa dor dentro de nós?
Nesse martírio constante...
Há! como queira por um instante,
Ter o colo dos meus avós!


De Filho pra Pai!

 

Pai, o senhor me ensinou,
desde o primeiro abraço,
qual o tempo é o espaço,
de que sempre me amou...
E todo o tempo que passou,
desde o meu primeiro dia,
seriam, afagos de alegria...
guardadas dentro da gente,
que se fariam presentes...
No mundo que eu teria.

Vieram dias a contragosto,
e aos poucos fui crescendo...
Pelo tempo, aprendendo,
as alegrias e os desgostos...
Quando via em seu rosto,
os sulcos marcados da dor...
Mas sempre o mesmo valor,
Carinho, afago, compaixão,
e me carregastes pela mão...
com seu exemplo de amor.

Aos poucos fui entendendo,
que é o amor que constrói...
E um Pai torna-se o herói,
mesmo quando não está podendo,
Se por dentro está sofrendo...
as dores e percalços da vida,
Por fora, a dor escondida,
de um coração em pedaços,
Sobra o conforto do abraços,
embora as chagas e feridas.

E a gente vai ganhando asas,
e o Pai fica lá na distância...
tudo o que se aprende na infância,
(os bons exemplos de casa)...
se apagam com frias brasas,
O Pai vira um velho, antiquado,
...que vive lá no seu passado...
não sabe nada da evolução,
Careta, antigo, sem noção...
Apenas um pobre coitado.

O tempo cobra o seu preço,
...(preço da dor da consciência),
e o Pai com a sua experiência,
Então volta tudo ao começo...
Vê nos netos o novo recomeço,
pras suas experiências de vida,
Lembrando estórias esquecidas...
Que os filhos não querem ouvir,
tentando novamente, construir...
A vida que fora perdida.

O Pai, que é filho envelhece,
tendo seu Pai mais distante,
O Avô já não se vê o bastante,
nos netos que também crescem,
E o ciclo da vida nos parece...
uma roda que nunca descansa,
O peso importante da balança,
Nos deixa, pela longa idade...
E o Pai então vira saudade,
Levando a mais rica heranças.

Agora choram a sua ausência,
Lembrando momentos vividos,
Alguns, de coração partido...
outros é a dor da consciência,
Tiveram toda uma existência,
para estarem junto aos Pais...
- mas eram momentos banais...
“Ele não vivia no mundo da gente”,
Ficou no passado... e o presente?
...o presente roubou, nunca mais!

Tenho pena de quem viveu...
Não tendo o Pai, ao seu lado!
ou destes que estão condenados,
num asilo, que o filho esqueceu,
Pois hoje, eu queria ter o meu...
e voltar a ser guri novamente,
Talvez faria tudo diferente...
Pararia no tempo e no espaço,
para ter o calor de um abraço,
e o Pai aqui junto da gente.

Na sombra da espora!

 

Os tempos eram outros... eu sei bem!
A História escrita com sangue de gente
Mapeava os campos a ponta de cascos
E desenhavam fronteiras no sul do continente.

A força da palavra que apartava os iguais,
Na injusta justiça de tirar o pai dos filhos...
Para pelear pela vida ou apenas ideais
Erguendo bandeiras para novos caudilhos.

Senhores do tempo, de estampa torena,
De grandes melenas e envoltos em trapos,
Desfilavam a rudez das vidas macabras...
Acreditando nas palavras, pobres farrapos!

Tropas estendidas pelos charcos da pampa,
Num horizonte tingido por aves daninhas...
Que faziam da guerra batalhas nojentas...
Com ideias sangrentas que não vêm sozinhas!

E um nome estampava as cores da guerra,
Senhores da terra com forças de vento...
Na República caudilha, o rastro do sangue,
Um amor ao Rio Grande nas tropas de Bento.

Senhor implacável, General de a cavalo...
Empunhando a espada entre lágrimas e suor,
E a pátria bendita de um sul de continente...
Voltava-se ao presente de um tempo melhor.

E o tempo das guerras ficou na memória,
Nos livros de história, senhores do tempo...
E tantos caudilhos, com amor pela terra,
Ergueram estâncias nos rastros de Bento.

Enquanto peões, de ranchos barreados...
Povoaram os campos, fartura de outrora,
Cinchando o progresso, a riqueza do estado,
Golpeando potros pelo aço da espora.

Birivas tropeiros, de bruacas recheadas,
Abriam picadas nos mapas das serras...
Erguendo povoados no beiral das estradas,
Que os cascos das mulas deixavam na terra.

E nas sombras copadas de chapéus de palhas,
Senhores do tempo sem tempo de agora,
Cortavam horizontes como fios de navalhas,
E encurtavam os sonhos no aço da espora.

Os tempos eram outros... eu sei bem!
Tantos que acreditavam num tempo melhor
Estátuas erguidas, pelas praças povoadas,
Mostravam um Bento com olhos de herói!

E os homens do campo, de poncho empoeirado,
De chapéus copados pelo rastro das tropas...
Assistiam ao progresso, em campos cercados,
De esporas calçadas no "garrão" das botas.

O mundo melhor, das promessas de Bento,
Não veio aos netos dos farrapos sem nome,
Que, hoje, ainda choram as desgraças herdadas,
No beiral das estradas, nas fileiras da fome.

E a história contada pelos livros de luxo...
Nas folhas timbradas pelo amarelo do ouro,
Talvez esqueceram de dizer aos gaúchos...
Que o tempo não seca as lágrimas de choro.

Foram-se as tropas de homens e bichos...
E sobraram os barracos expostos ao tempo,
Onde os netos da guerra sobrevivem do lixo,
Ouvindo as promessas dos netos de Bento.

E lá, mais adiante, pelo frio das calçadas,
Vendo o corpo do filho estirado ao relento,
A desgraça estampada de uma mãe que chora,
Na sombra da espora, da estátua de Bento!