quinta-feira, 3 de agosto de 2017

No Silêncio da Tapera!

À tarde, deitava quieta,
Sobre o manto do coxilhão,
Calando a voz do rincão,
Que adormecia ao relento...
Nenhum gemido de vento,
Nenhum acôo de cachorro,
Só algum uivo de sorro...
Que se perdeu pelo tempo;

Bem ali, da velha tapera...
Eu ia buscando lonjuras,
Perdida pela planura...
De um horizonte sem fim,
Estendido nestes confins,
Onde, até, os olhos turvam,
E as lembranças se curvam...
Nas imagens que há em mim;

E por instantes, foi passando,
O que o tempo não contou...
O que a história resguardou,
D’uma triste noite de outono...
Quando a vida perde entono,
Calando n’alma da gente,
E traz o passado ao presente,
Ruínas do próprio abandono;

Não estava ali, por acaso,
Tão pouco porque eu queria,
Mas já era, chegado o dia,
De buscar a velha morada,
Hoje, uma tapera judiada,
Guardando tristes relatos,
Que um dia fora, de fato...
A minha história, contada;

Era noite de fim de Maio,
Que se quedava ao negrume,
E uma família, de costume,
Já se recolhia, mais cedo,
Talvez guardando segredos,
Quem sabe dor e amargura,
Tisnada pela noite escura...
Que adormecia de medo;

De longe, ouviu-se um tropel,
Depois, gritos e algazarras,
Relinchos, tiros e farras...
Bater de cascos da eguada,
E uma angústia acaranchada,
No olhar de quatro viventes,
Que acordaram de repente,
Vendo a casa velha sitiada;

Então, berrou um fuzil...
Abrindo um clarão no céu,
E a parte negra de um véu,
Que a noite quieta trazia,
Fez refúgio para rebeldia...
Daqueles instintos cruéis,
Que por uns contos de réis,
Uma vida, de nada, valia;

Assim, arrastaram esporas,
Batendo de porta em porta,
Mas se a vida nada importa,
A morte sempre é o final,
Quando um ser, vira animal,
Num barbaresco fascínio,
Fazendo o próprio extermínio,
De outro ser, seu igual;

E uma porta se veio abaixo,
E uma janela foi arrombada,
E lâminas de adagas afiadas,
Passeando pela escuridão...
Em busca d’algum patacão,
Os réis da tropa vendida...
Que ali estavam escondidas,
Sob o forro de um colchão;

Então, veio o desespero...
Choro, gritos e lamentos,
Pedindo por sentimento,
Que lhes poupassem a vida,
Levasse roupa, comida...
Ponta de gado, dinheiro,
Mas barbarismo traiçoeiro,
Não deu tempo pra despedida;

E a lâmina afiada da adaga,
Foi passando sem piedade,
Como se o ódio e maldade,
Fosse irmã da mesma sorte,
Abrindo talhos e cortes...
Na carne branca de gente,
Onde três almas inocentes,
Foram findando, na morte;

Havia quatro ali na casa:
Os Pais, o genro e a filha...
Parte linda de uma família,
Que a morte lhe separou,
Mas um deles ainda sobrou...
Escondido sob um fogão,
Que a morte naquela ocasião,
Por sorte, não lhe condenou;

Pois é ela que eu me refiro...
Por isso voltei a este lugar,
Para o passado encontrar,
Tirar um peso dos ombros,
Dizem que ainda há assombros,
Nas noites de lua cheia...
Onde três almas, vagueiam,
Buscando ela, nos escombros;

Ela que falo, é minha avó,
Que nunca encontrou a paz,
E pela noite, ainda, desfaz...
Na elucides de sua mente,
Clamando por sua gente,
Num mundo louco e incerto,
Quem viu a morte de perto,
Trazendo um filho no ventre;

Porque que a morte é assim?
Porque o destino é cruel?...
Porque há um gosto de fel,
Amargando noites de espera?
Passaram tantas primaveras,
E aqui nunca nasceu uma flor,
Talvez por sentir esta dor...
Que ronda o frio da tapera;

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