quarta-feira, 2 de agosto de 2017

Nos Pregos da Cruz!

Romperam minha carne fraca,
No aço fúnebre dos pregos...
Esvaeci-me no sangue do pecado,
...de uma humanidade perdida.
Que se alimentam das aberrações,
Sem se importar com a verdade,
Alienado de um mundo imposto,
Na massificação dos sentimentos.

Carreguei a cruz desses tantos...
Que vagam pelas ruas e casebres,
Adormecidos à beira da fome,
Sem sonhos, sem alma, sem luz.
Esquizofrênicos de olhares tesos,
Perambulando na imaginação alheia,
Balbuciando palavras lúdicas...
...Da boca de falsos profetas.

Que valeram as minhas palavras?
De que valeu o meu exemplo?
De que valeram a dor dos cravos...
Se tudo o que fiz ninguém mais lembra?

O mundo foi ganhando formas,
Na busca incessante pelo poder.
A humanidade despida de sentimentos,
Perambula pelas ondas do prazer...
Como se o amor fosse a novidade,
Sensações descartáveis em cada ser,
De olhos vendados...de bocas caladas,
Na insana ansiedade de apenas vencer.

Hoje, tudo pode, que tem jeito,
As leis dos Homens é que tem valor,
Mas o mundo ainda sofre na dor...
...dos órfãos sem sonhos para viver.
...das guerras que matam inocentes,
...das injustiças que alimentam descrentes,
De vícios, de orgias e de prazer.

De que valeram as minhas palavras?
De que valeram as tábua de lei?
Os sermões na montanha?
Caminhar sobre as águas?

O mundo incrédulo ainda paira na dor,
Na busca de uma vitória, sem luta...
Desfilando sua ira na hipocrisia do ter,
Guardando fortunas inatas...
Ganhando valores sujos...
Massacrando os de menor poder,
Sem ao menos descobrir seu valor.
Mundo insano...hipócritas femorais.
Atormentados na injustiça pagã.

Ainda sinto as dores dos cravos,
Nas mãos as chagas do aço...
No peito a dor dos aflitos,
No olhos as lembranças de mim.
Mas de que valeu tudo isso?
Se os meus ainda me renegam,
Se irmãos ainda não me vêm,
Se usam meu nome em bocas erre ondas.

Não pensem que o mundo está no fim,
Não pensem que tudo acabará...
Não esperem a minha volta...
Porque eu nunca fui...eu nunca parti.
Sempre estive aqui nos filhos órfãos,
Nos doentes, sofridos...
Nos indefesos das guerras,
Nos que vivem na dor das calçadas,
Nos que morrem na fileira da cura,
Nas palavras doces dos que tem fé.

Porque a dor da regeneração,
Onde os humildes são exaltados,
Os enfermos são curados...
E vive, feliz, numa vida longa.
Mas não aqui...não nesse plano...
Nesse tempo...nesse espaço.
Viverão no Paraíso de um mundo melhor,
Onde não sentirão a dor...
...de um corpo flagelado...
Nem a injustiça do Homens condenando,
E ter o corpo, inerte, sangrando...

...Nos Pregos na Cruz!

As Mãos do meu Avô!

 As mãos do meu avô eram grandes,
Com dedos em formas de garras...
Enrijecidas na parte adunca dos calos,
Desenhavam os mapas da vida...
Pelas linhas profundas de um M,
Que pareciam sangas já secas,
Transbordadas em outras enchentes.

As mãos do meu avô eram abrigo,
Quando embalavam os meus sonhos,
Cantarolando com a sua voz rouca,
Cantigas que ainda trago na alma,
E olhando no verde dos meus olhos,
Balbuciava as frases mais ternas,
Com palavras tão doces e tão suas,
Que ainda me sinto o mesmo piá...
Choramingando para ter seu colo.

Quando dos meus primeiros passos,
Cambaleando as pernas tortas,
Buscava encontrar as suas mãos...
Para me segurar dos tombos;
E aquele sorriso esbugalhado,
Sulcados por grandes vergas...
Que desenhavam a fronte séria,
De uma barba branca e rala.

E depois... Já piazote taludo...
Quando encilhava um petiço,
E saíamos a recorrer os campos,
Refazer as cercas, juntar o gado;
E aquelas mãos grandes e fartas,
Se agigantavam no cabo do arado,
Abrindo vergas no coice do tempo,
Socando terra nos buracos da vida.

As mesmas mãos que torciam arames,
Sustentavam touros no golpe do laço...
Torciam atilhos na cabeças da tramas,
Sofrenavam potros só com tento e crina...
Ponteavam milongas no braço do pinho,
Acariciavam as cuias nas horas dos mates,
Me afagava os sonhos na hora do sono,
E juntavam-se em reza na oração da fé!
  
Sei que o tempo é campo deserto...
Por onde passamos para deixar marcas,
E as dores são mãos que apontam o rumo,
Que por vezes, nos chicoteiam...
Quando nos perdemos nas manhas da vida,
Sem querer buscar o caminho certo.

Assim eram as mãos do meu avô!
O equilíbrio para os meus passos falsos,
O abrigo para os tempos de invernia,
A carícia para as horas tristes da dor;
Ágeis pelo pontear das cordas...
Rudes e fortes no apontar dos dedos,
Leves e brandas no afagar do sono,
Amiga e parceira no apertar do adeus.

A vida por si não contempla lamentos,
E nos dá a certeza que o tempo se foi,
E o que fica do tempo, além dos sonhos,
São apenas imagens a elucidar a alma;
E um dia as mãos que me deram afago...
Que foram carinho nas horas da dor,
Se postaram inertes, tão juntas e tão só,
Sobre um corpo estirado quieto e frio.

No olhar de quem fica, marejado de dor,
O silêncio é castigo (rebenque que bate),
E o coração apertado na ânsia mais terna,
Sufoca as lembranças em fotos amarelas;
E parte sem adeus, sem mãos abanando,
Talvez o encontrarei num tempo depois,
O que ficou escondido, cada palmo de campo,

Que o tempo e a vida guardou de nós dois.

Na sombra da espora!

 Os tempos eram difíceis, eu sei!...
A História escrita com sangue de gente,
Mapeava os campos a ponta de cascos,
E desenhavam fronteiras no sul do continente.

A força da palavra que apartava os iguais,
Na injusta justiça que tinham Pais e filhos...
Peleando pela vida ou apenas, ideais,
Erguiam bandeiras para novos caudilhos.

Senhores do tempo, de estampa torena,
De grandes melenas e envoltos em trapos,
Desfilavam a rudez das vidas macabras...
Acreditando nas palavras, pobres farrapos!

Tropas estendidas pelos charcos da pampa,
Num horizonte tingido por aves daninhas...
Que fazem a guerra, batalhas nojentas...
Com ideias sangrentas que não vêm sozinha!

E um nome estampava as cores da guerra,
Senhores da terra com forças de vento...
Na República caudilha o rastro do sangue,
Um amor ao Rio Grande nas tropas de Bento.

Senhor implacável, General de acavalo...
Empunhando a espada entre lágrimas e suor,
E a Pátria bendita, de um sul de continente...
Voltava-se ao presente de um tempo melhor.

E o tempo das guerras, ficou na memória,
Nos livros de história, senhores do tempo...
E tantos caudilhos, com amor pela terra,
Ergueram estâncias nos rastros de Bento.

Enquanto peões, de ranchos barreados...
Povoaram os campos, fartura de outrora,
Cinchavam o progresso, a riqueza do estado,
Golpeando potros, pelo aço da espora.

Birivas tropeiros, de bruacas recheadas,
Abriam picadas no mapa das serras...
Erguendo povoados no beiral das estradas,
Que os cascos das mulas deixavam na terra.

E nas sombras copadas de chapéus de palhas,
Senhores do tempo sem tempo de agora,
Cortavam horizontes como fios de navalhas,
E encurtavam os sonhos no aço da espora.

Os tempos eram outros... eu sei!
Tantos que acreditavam num tempo melhor,
Estátuas erguidas, pelas praças povoadas,
Mostravam um Bento, com olhos de herói!

E os homens do campo, de poncho empoeirado,
De chapéus copados pelo rastros das tropas...
Assistiam o progresso, em campos cercados,
De esporas calçadas no "garrão" das botas.

O mundo melhor, das promessas de Bento,
Não veio aos netos, dos farrapos, sem nome,
Que, hoje, ainda choram, as desgraças herdadas,
No beiral das estradas, nas fileiras da fome.

E a história contada pelos livros de luxo...
Nas folhas timbradas pelo amarelo do ouro,
Talvez esqueceram, de dizer aos gaúchos...
Que o tempo não seca as lágrimas de choro.

Foram-se as tropas de homens e bichos...
E sobraram os barracos expostos ao tempo,
Onde os netos da guerra sobrevivem do lixo,
Ouvindo as promessas dos netos de Bento.

E lá mais adiante, pelo frio das calçadas,
Vendo o corpo do filho estirado ao relento,
A desgraça estampada de uma mãe que chora,
Na sombra da espora, da estátua de Bento!

Mulheres Acorrentadas!

 Houve um tempo, sim...
Em que nós, mulheres, fomos acorrentadas
ao tempo, aos sonhos, a um mundo de desencantos,
de tristeza, de inferioridade.

A mulher, apesar de sua grandeza interior,
de dar vida a outras vidas, de alimentar em nossos seios
a fome dos filhos e de filhos que não eram nossos...
víamos a vida passar, pela clausura de um mundo escuro,
sem forças, sem caminhos, sem esperança, sem cor...

E a dor do dia a dia, a humilhação para sermos menor
do que somos, de sermos vistas como objeto de luxúria
e prazer, servindo apenas para a procriação do mundo,
como fêmea parideira para o orgulho de varões e coronéis.

Fomos sim...
Submissa a conceitos inúteis, escravas do preconceitos,
Mulheres que pensavam pela cabeça do outros,
que só tinham o “sim” como resposta.
Filhas exemplares... esposas submissas...
amantes inveteradas...trabalhadoras sem pagamentos:
- cozinheiras, lavadeiras, passadeiras, parideiras...

Obedecendo a uma sociedade hipócrita, nojenta e machista,
...que viam numa figura meiga, linda, angelical, a imagem da fraqueza, 
onde depositavam a sua soberba e seu ódio,
e seus olhares chicoteados de rancores e obsessões.

Fomos sim...mas não somos mais!
Não somos mais mulheres acorrentadas nesse passado fúnebre,
que nos envergonha, que nos chicoteia em pensamento loucos,
que nos escravizavam aos medos, ao preconceito e a tristeza.

Somos Mulheres valentes, que amantamos sim...
que parimos, sim...
que trazemos vida ao mundo por amor e por amar...
Por ver num filho a esperança de um tempo novo.

Fomos a luta...lutamos!
Vamos a cama...amamos!
Sorrimos, choramos, amamentamos...
Porque somos melhores, somos grandes, somos fortes!

Nos fizeram crer que somos uma costela de um tal de Adão,
Para não dizerem do somos coração, somos alma e sentimentos,
...força interior que se agiganta, que fascina, que ama e sonha,
que acalma e ensina, que aconchega e que traz vida.

Somos Mãe...somos filhas...somos mulheres...
...e tiramos as correntes, abrimos os cadeados, 
enxergamos a vida e vimos a liberdade.
...porque lutamos por ela e conquistamos!
E as lágrimas que hoje derramamos, são de amor,
são de vida... são de verdades.

Chega de dor!
chega de amar, sem receber amor...
chega de somente dar, sem nada receber...
Chega...simplesmente chega!

Não somos corpos frágeis que se quebram ao primeiro toque,
...que se escondem ao preconceito.
Que se humilham...
Que são açoitadas por olhares infames...e choram!
...que se abatem ao primeiro não.
...que se calam à primeira esgrima.

Não! 
Nós somos bem mais que tudo isso...
Porque vencemos: 
- vencemos a vida...vencemos o tempo...
...e vencemos o preconceito de seres bestiais,
que se fizeram às custas, de mulheres acorrentadas!

Morri, Senhores!

Não...Não me entendam mal,
Eu morri, senhores!
Morri, como morre o tempo,
Que vai e deixa saudade,
Para um tempo novo renascer.

Morri, como morrem as noites,
Que partem em silêncio...
Dando luz ao um novo dia,
Bem mais claro, bem mais forte,
Com as cores de um sol, ao nascer.

Eu morri, senhores!
Morri para tudo o que não vale a pena,
E para essa dor que me condena,
A viver de uma saudade,
A viver de uma ansiedade,
Como se eu pudesse buscar no tempo,
O tempo que eu não tenho mais.

Morri, como morrem as primaveras,
Os outonos, os invernos, os verões.
E num ciclo de esperas e tempos...
De morrer e renascer...
De viver buscando horizontes novos,
De ver os dias passarem às pressas,
De ver luas e sóis...
De ver noites e estrelas...
De ver chuvas e ventos...
De ver sonhos sonhados...
De ter lembranças, passados,
A gente se dá conta que tudo já morreu,
E só nós vivemos enclausurados,
No que somos, no que pensamos, no que temos!

Por isso não chorem a minha morte!
Por isso não busquem à minha lápide.
Porque o que morreu não foi o eu, carne,
O que morreu foi o eu, apego...o eu mesmice.
Pois me afasto de tudo o que não foi bom,
E solto nas águas profundas os meus desapegos,
Pra renascer num novo tempo, num novo espírito,
No mesmo corpo, na mesma imagem...
Mas com semblante renovado num sorriso,
Num gesto e na beleza de um olhar.

Não quero que lembrem da minha morte:
Nem do dia e nem da hora.
Porque jamais importa a partida,
Mas sim a chegada, quando se abraça,
Quando se afaga e quando se dá calor.

Meu corpo, que nunca foi meu...
Continua aqui, da mesma forma,
Com a mesma embalagem...
Mas o espírito, esse que sempre foi meu,
Está mudado, com saudade do tempo antigo,
Mas renascido num tempo novo...
Cheio de vida, cheio de sonhos, cheio de amor,
Tão feliz, rindo da minha morte!

Não...não me entendam mal,
Mas às vezes temos que morrer.
Sem dor, sem mágoas, sem lágrimas,
E buscar dentro de cada um o dia novo,
O sol brilhando, à chuva mansa, a noite estrelada.
As primaveras que florescem a vida...
Os invernos que esfriam os desapegos...
Os outonos que enxovalham os olhos...
E os verões que aquecem o coração.

Pois somente assim, nos encontraremos
Com o que temos, com o que somos,
E então veremos que não somos nada,
Apenas um corpo esperando a sua morte!

Eu morri, Senhores!

Mas não chorem por mim.

Meu Vício!

Não...não me condenem mais...
Meu vício é cruel e já me condenou.

Eu nunca pensei em ser tão fraco diante dela,
Nunca imaginei que poderíamos nos separar,
E que essa ausência fosse me machucar tanto!
No princípio, eu não me via com ela...
Ela era tão distante, tão grandiosa, tão sublime,
Que todas as vezes que nos encontrávamos,
Eu não a entendia, não a compreendia...
Havia um mundo imenso entre eu e ela.


Um dia resolvi escutar o silêncio...
Então, eu lhe ouvia!
Escutei o canto dos pássaros,
E também lhe ouvia!
Escutei a água do riacho correndo entre as pedras,
E lá estava ela, magnifica, encantadora.
Escutei o vento nas folhas das pitangueiras,
E na verdade era ela cantando pra mim.

Por um longo tempo me abstrai dos livros...
Fiquei longe das folhas dos cadernos...
Porque eu a via no brancor do papel,
Deleitada entre as linhas enegrecidas.
Afastei-me do mundo, esqueci a lua,
A chuva, o mar, o sonar dos ventos...
O balançar dos galhos, o bailar das flores,
Por que em tudo eu via-te lá!

Tranquei-me num quarto frio e só...
Fechei-me do mundo e para o mundo,
Criei vazios, retruquei as lágrimas...
Enxuguei a alma e refiz os planos.
Ali, sozinho, alimentando a angústia,
...das horas de quietude e solidão...
Ouvia a tua voz no tic tac das horas,
Versejando palavras doces na minha ilusão.

Tranquei-me como se trancam os loucos,
Para tentar viver longe de ti...
Mas quanto eu mais me escondia,
Mais perto de mim tu estavas...
Quanto mais tentava te esquecer,
Mais verdadeira tu te encontravas,
Quanto mais silêncio havia...
Mais tu gritava dentro de mim.

Não...não me condenem mais...
Meu vício é cruel e já me condenou.

Tenham paciência comigo...
Entendam que sou normal,
Que sou humano, que erro,
Que tenho defeitos e dores,
Que sofro por amar de mais,
Que choro por meus amores.

Se nascemos um para o outro,
Se no fundo tu só me faz bem,
Porque esse vício louco...
Que outros tantos não tem?

Se por onde ando eu te vejo,
(A muito tempo, és parte de mim),
Se, te sinto na doçura de um beijo,
Se, te vejo num flor do jardim...
Se, te encontro nas madrugadas frias,
Num fim de tarde que o sol aquece...
Tu és a razão dos melhores dias,
Quando a minha alma emudece!

Que todos entendam essa minha dor,
De não saber mais, viver longe de ti...
Se, todo coração sofre por um amor,
Tu já viestes comigo desde que nasci,
Fostes parceira nos horas mais tristes,
Enxugou-me os olhos, nas marés da solidão,
Fostes carinhosa e até, hoje, persistes...
Em ser a dona desse pobre coração!

Desculpem esse meu desabafo...
Circunstâncias que me tornam racional,
Saber que esse amor é tão grande,
Talvez não haja. um outro amor igual.
Não me importo de ter sido escolhido,
Execrado até o final dos meus dias...
E morrer depois de ser condenado...
Por um vício...chamado...Poesia!

INSANO!


Às vezes, me paro, sem saber quem sou!


Fugindo da sombra que me persegue,
De olhos esbugalhados,
eu vejo àquilo que ninguém vê...
Que ninguém consegue!
E busco na elucides dos dias...
Os dias que já foram embora;
Porque o que vejo, o que sinto,
Não está escrito em livros atuais,
Nem nas lápides frias que enfeitam
as memórias tolas e desumanas...

Uns dizem que sou louco!
Outros me olham com desleixo,
E há tantos que nem me olham,
Porque o que falo, não entendem,
O que vejo, não enxergam...
O que busco, não compreendem,
E o que sou eles não sabem!

Meu refúgio são as letras...
Minha casa são os livros,
O meu mundo é bem maior,
E não tem tempo, para o tempo,
Não é marcado por hora...
Não se conhecem os dias.

Para mim o que vale é viver,
É ver a beleza da noite...
O brilho das estrelas,
O encanto do mar, do céu;
É amar sem cobrar...
É doar sem pedir,
É alimentar sem ter fome,
É viver para viver...
Sonhar, compreender, sorrir!

Às vezes, me paro sem saber quem sou!
Mas o que importa o meu ser...
No meio de tantos que vão e vem?
Sou mais um perdido na multidão.
Tão longe de mim, tão perto do nada,
Há àqueles que me veem e fingem que
não me veem...
Há outros que veem e nem querem ver,
E todos passam e a vida passa e o
tempo passa, mas eu fico...
Fico na minha elucides!

Porque elucides é fuga...
É distância da distância...
É solidão rodeada de gente,
É um mundo indiferente,
Sem portas, nem janelas,
É casa sem teto...
É vida sem vida...
É apenas um espaço onde
cabe apenas um...
Eu!

Hoje eu queria falar com Deus!

                                         
Hoje eu queira falar com Deus!
Mas as portas do templo, fechadas,
Guardando silêncio e vazio...
Na angústia que me aperta o peito,
Calando esta alma, triste e só.

Sentado enfrente da velha igreja,
Tentando encontrar respostas vãs,
Deparo-me com a realidade crua,
Que atormenta olhares cansados,
E rebusca entre as paredes frias,
A fé que boceja em forma de oração.

Hoje eu queria falar com Deus!
Porque meu rosto cansado...
Vergado pelas rugas do tempo,
Que se contraem, na dor efêmera,
Dos que sofrem calados...
Distante de amores...
Distante das casas...
Distante da vida...
E do mundo que é meu.

O sorriso farto e olhos esbugalhados,
De um menino de pés descalços...
Levam-me para uma infância,
Longínqua e bela...
Onde o verde de um campo vasto,
Desenhavam coxilhas nuas,
Como um corpo de moça em suave retoque,
Espelhada no azul celeste...
Em cristais de vidro e barranca.

A mão gorda e branca...
Que me acena na ingenuidade de um Adeus,
E as bochechas rosadas,
Balbuciam palavras doces,
Enquanto seus pés branquinhos,
Desenham formas na terra molhada.
  
Ao meu lado, um velho sorrindo,
Escorregam, seus olhos, nas folhas de um livro,
Balbuciando histórias que ao tempo se foi;
E uma menina sapeca...
Ninando suas bonecas...
 Aconchega as mãos brandas em suave afago,
E lambuza um rosto, de rugas fartas,
Com a doçura de um beijo.

Hoje eu queira falar com Deus!
E atento ás portas trancadas,
Rodeadas de pedras e cimento,
Arquitetadas a preço de ouro,
E sacrifícios humanos...
Fechadas aos que mais precisam,
Repousam na descrença de tantos,
Que vivem sem rumo,
Sem paz e sem pão.

Atento à dor da minha alma,
Eu nem percebi, na ingênua busca,
Que Deus é maior...
E não vive trancando...
Em templos afortunados,
De altares e Santos dourados,
Onde se depositam pecados,
De bocas infiéis.

Só hoje, pude perceber:
No vôo de um pássaro...
Num sorriso de criança,
Na dor que separa os iguais,
Na luz de um sol, que enche os olhos,
Fecundam sonhos e farta sorrisos...
A própria imagem do Deus que eu busco,
Foi neste momento que pude compreender,
O que existe em cada ser,
Em cada vida... em cada olhar,
E o Deus que eu vivia a procurar,

Encontrei aqui, guardado dentro de mim!